Acordei hoje cedo e me deparei logo que liguei o computador com uma publicação no Twitter do
Guga Chacra (comentarista internacional do Estadão e do Globo News) que dizia:
"Governo argentino teme queda no turismo em Buenos Aires porque muitos brasileiros têm vergonha de ir à Argentina e serem zoados".
Prometi para mim mesma que não traria esse assunto ao blog porque ainda que o mesmo seja segmentado e não seja lido por um mar de gente, o que eu falo é levado em consideração para muitas pessoas. Mas diante disso eu resolvi emitir MINHA opinião baseado NO QUE EU vivi (e vivo) na cidade durante 3 copas aqui.
Quando criança eu realmente não me importava para futebol, nem quando Brasil perdeu para a França eu me importei muito. Peguei minhas bonecas e fui brincar e tentar animar o clima de funeral que havia no churrasco na casa dos meus tios. Sabia que aquilo não era comum e, sim, tinha flashes da Copa de 94 quando minha mãe, grávida da minha irmã até então, se ajoelhou na frente da TV da casa da minha avó com a Nossa Senhora Aparecida em mãos e vibrou tanto com a vitória que eu achei que a Heloisa iria nascer antes.
Enfim, eu não fui criada em um ambiente no qual se odiava o futebol argentino. Não fui mesmo, aliás eu não me importava quando eles jogavam e não me lembro na minha família de alguém torcendo contra.
Logo no primeiro ano aqui, aconteceu a Copa de 2006 na Alemanha, Brasil era a principal promessa por ter levado a de 2002. No colégio, eu ouvia uma tiração de sarro com fundo de inveja. "
Porque Brasil siempre se gana todo", porque Brasil isso e aquilo outro. Eu nunca revidei nada, mesmo porque, para mim, era inútil brigar com pessoas dentro de sala que poderiam virar meus amigos. Eu ria, não tirava sarro e ficava por isso mesmo.

Até que a Copa de fato chegou. O colégio parou, foi colocado um telão imenso no pátio e todo mundo queria ver o jogo. Argentina ganhou todos os jogos da primeira fase, mas ouve um em especial que eu não me esqueço: eles ganharam por 6 gols de diferença. Suficiente para todo mundo achar que eles já tinham levado a Copa para casa. Nesse dia, precisei que meu pai fosse me buscar no colégio porque eu não conseguia escapar e ir para casa. Foram me seguindo por vários quarteirões cantando a mesmíssima música de hoje: Brasil, Decime que se Siente. Mas ao invés de "
tener en tu casa a papá" era algo adaptado. Música que aliás, eu já ouvia nos confrontos entre colégios do mesmo bairro.
Fiquei com medo dos outros jogos que viriam e passei a ser meio excluída do grupo de amigos, só a angolana Pri que topava lanchar comigo. Chorava quase todos os dias. Frente à isso, eu passei a crer que essa rivalidade não poderia ser deixada de lado, e depois que Brasil foi eliminado, confesso que aliviei quando Argentina também foi.
Nos meses que se seguiram no colégio, minha irma novinha relatou episódios de discriminação e éramos várias vezes chamados de macacos por professores. Me ofereciam banana e eu, inocente, não entendia. Meus pais foram conversar e a palhaçada diminui, mas não acabou. Sempre que encontravam um jeito, falavam novamente. Ser chamado de macaco aqui não é preconceituoso, portanto não posso falar que era para nos tirar do sério, mas era algo que sim, nos tirava.
Diante disso, a feira internacional de países aconteceu na escola e minha mãe com as amigas dela resolveram mostrar que Brasil era dos melhores e fizemos maior festa, colégio pirou com o grupo de samba que levamos e depois só nos restou ouvir novamente aquela mesma coisa "
Pero son tan alegres en Brasil, los queremos tanto".
Depois do Mundial de 2006 para 2010, eu estava mais preparada. Sabia como responder as ofensas com um simples 5x2. E levei mais na brincadeira, mesmo porque esse Mundial da África não alegrou muito os argentinos.
Mas esse no Brasil, ai rapaz... Começou cedo. Ofensas a mil, tiração de sarro levada fora dos estádios e eu só no unfollow e desfazendo amizades. Eu sou da opinião que só quem mora aqui que pode opinar, quem vem passar férias não tem muito porque opinar sobre a rivalidade porque não sentiu na pele e vive de fatos. Mas as pessoas são livres para falar o que quiser.
Se olho para os fatos posso afirmar sim que a publicidade brasileira tira mais sarro que a Argentina, que existem (ou existiam) mais brasileiros que não curtiam os hermanos que ao contrário e que de fato a mídia extrapola na rivalidade. Galvão Bueno falando que "
é bom ganhar, mas ganhar da Argentina é melhor ainda" não ajuda muito e quem nasce sem essa rivalidade, logo a ganha.
E se eu paro para pensar de onde saiu tanta briguinha eu não sei explicar. Mas existe e é um fato e reina entre nós e atrapalha, principalmente, a vida de expatriados em ambos países. Vi muita gente compartilhando textos e mais textos no facebook dizendo que só os brasileiros que cutucam e que argentino não faz isso. Desculpa a sinceridade mas me parece hipocrisia isso, minha opinião. Argentino tampouco nunca foi santo para tal rivalidade, a diferença é que antes ninguém prestava atenção porque Argentina nunca foi foco de assuntos televisivos e se não fosse essa Copa na qual milhares de argentinos tiveram a possibilidade de invadir o Brasil, as pessoas não saberia dessa música "
Brasil, Decime que se Siente" porque simplesmente não se interessam. Estou errada?

Aliás, se levo mais a fundo, comigo e com a minha família sempre foi ao contrário, sempre nos vinham atacar com a rivalidade. Eu não sou do perfil de gente que vai cutucar, só respondo se me ofendem caso contrário finjo que a Copa não existe quando falo com argentinos.
Mas, de novo, essa Copa vem sido minha pior fase aqui. Até ouvir que eu deveria voltar ao meus país de 7, eu ouvi. Que porque eu não torço para Argentina quando eu moro aqui. Ora gente, deixemos de ser bobos. A rivalidade que hoje eu levo comigo, muito ocasionada pelas más experiencias em outros Mundiais, é sadia e eu respeito meus amigos (coisa que eles não fizeram comigo nessa Copa, confesso), mas o fato de adorar a cidade não me obriga a torcer por eles, desculpa, ainda mais quando eu ouvi o que ouvi. Ainda que eu saiba que esses argentinos não representam a totalidade dos argentinos aqui, dói, viu? E bastante por sinal. E se eles me perguntam que se siente é isso:
se siente pésimo y no lo deseo a nadie.
Nesse Mundial eu os notei muito mais ofensivos mas, na mesma moeda. Argentina x Irã: brasileiros com camisetas do Irã + argentinos cantando "
Brasil, decime que se Siente". Ao contrário do que muitas pessoas vem falando de que Argentina está revidando, eu acho que os argentinos estão levando à luz de que sempre ouve, também, rivalidade aqui e que só agora vem sido conhecida.
A
Banda de los Granaderos no dia Independência Argentina, 9 de julho, parou a apresentação oficial para cantar a musiquinha. A rede de celulares
Movistar (como se fosse a VIVO no Brasil) disponibilizou grátis o download da mesma para ter como toque de celular,
os cafés que eu mais adoro em BUE publicam em seus perfis do facebook a música que é para todo mundo aprender, os argentinos comemoram suas vitórias cantando a mesma, independente do oponente.
No Brasil, marcas de cervejas despacham argentinos para Buenos Aires, a mídia dedica páginas e se alegrava, até então em outros Mundiais, da derrota dos hermanos. Páginas e páginas no facebook dedicadas a torcer contra e a favor dos alemães (considerando a popularidade de Podolski, da compaixão por nós depois do desfecho trágico e do quanto eles nos fizeram ver que Brasil é bom pra caramba, cantando músicas do Bahia, socializando geral).

Eu acho que a mudança vem dos grandes, Neymar falando que torce por Messi e Mascherano é um balde de maturidade, que Mascherano e Aguero não souberam ter (digo isso porque quando ambos ficaram sabendo disso comentaram que não precisavam da torcida de fora e ironizaram o jogador brasileiro, assim não dá né gente? E o exemplo?). E não tem sido fácil. Não mesmo. E para quem perguntou, nesse jogo eu estou neutra. Tenho muitos amigos argentinos, mas eles não torcem para o Brasil, e o fato de morar aqui não me obriga a torcer para eles, os respeito e quero eles contentes. Mas também não posso torcer pra Alemanha, porque né... Não dá. Mas tenho amigos alemães que, diferentemente dos argentinos, vieram me consolar depois do jogo.
Enfim, poderia falar muitas outras coisas, mas meu desabafo é: ainda bem que hoje acaba. E para finalizar um recado, NO CASO de zoação (porque pode não haver), há inúmeras formas de revidar, mas a melhor delas é ignorar. E se há algo que nós temos de melhor é a felicidade e o sorriso, isso ainda é nosso. Olhem o que foi essa Copa. Ok? Beijocas e se precisarem de ajuda, estou por aqui.