Morar em Buenos Aires nunca foi meu desejo de pirralha. Quando eu fiquei sabendo que viria pra cá, totalmente a contra gosto, chorei durante várias semanas. Boba. Me acostumei, passei por altos e baixos e ainda passo. Por isso é que essa semana vamos mudar um pouco a rotina do blog.
Esse post aqui é um pouco triste e pensei muitas vezes em não escrevê-lo. Mas, eu sou sincera e diferente de muitos outros blogs por aí, eu controlo tudo por aqui e não devo contas a ninguém, grazadeus. O blog tem mais de 300 posts falando sobre essa cidade que eu tanto amo. E confesso, que muitas vezes escrevi posts sem ter muita inspiração, porque poxa: a vida é assim, uma montanha russa.
Acontece que os meus últimos 10 dias não foram nada agradáveis aqui. Dizem meus amigos engraçadinhos que eu nada mais passo por um inferno astral. Vai saber, eu sei que isso vai passar. E como eu escrevo com o coração aqui no blog, devo admitir que essa semana eu não estou com vontade de falar sobre nada. E diferente do que sempre acontece: ter posts preparados até o sábado, essa semana eu só tenho esse post aqui - de minha autoria - que você está lendo na caixinha dos programados. Os outros são de participações especiais queridas. E vou explicar porque.
Sexta-feira, 26 de abril: acordei cedo as usual, fui pro trabalho. Eu sempre vou ao trabalho de mochila. Já deixo ela sempre no esquema pra poder só acordar, pegar as coisas e partir - assim tenho mais uns 5 minutinhos na cama, coisaboa. Nesse dia eu resolvi passar antes, no kiosco que tem na esquina de casa para comprar um iogurte para tomar café da manhã porque eu não tinha NADA em casa. Ok, comprei. Fui pra parada do ônibus. Passei a Sube, fiquei uns minutinhos em pé e logo me sentei. Caminhei as 8 quadras até meu trabalho e quando cheguei na empresa vi que minha mochila estava aberta. Procurei o celular porque precisava do telefone de uma amiga e vi que ele não estava. Achei que tivesse esquecido o bendito em casa. Liguei no celular, um cara estranho atendeu, dizendo que se eu quisesse o celular devolta teria que encontrá-lo. OI? Ok, furto, me roubou e NEM FERRANDO vou ver ele pra pegar um celular, ainda não estou louca.
Passado o estresse, resolvi comprar no mesmo dia um cel novo, odeio ficar incomunicável. Fui à Movistar, uma das operadoras de celular daqui (o equivalente a Vivo no Brasil) e fui super bem atendida, moço simpático me vendeu outro cel, com outra linha, um preço ok, um plano ok também. Saí de lá contentizinha porque tinha um cel novo e mais moderno. O que eu não tinha reparado até então era que o cara, além de ter furtado meu celular tinha me roubado a Sube também e eu estava, literalmente, com 25 centavos de moedas no bolso.
Entrei no banco, saquei dinheiro, tentei em 5 kioscos trocar o mínimo possível em moedas, todos super mal educados não me ajudaram. Entrei, finalmente, numa loja zuada e fiz cara de piedade pra mulher, dizendo que tinha sido assaltada e que precisava trocar 5 pesos em moedas para poder voltar pra casa. Ela me trocou, ainda bem. Com isso eu achei uma lojinha de um senhor que vendia (eba) a Sube. Comprei um cartão novo que no dia seguinte já poderia usar.
Voltei pra casa, meio cansada, ainda que tivesse sido meio estressante e frustante por ter sido furtada e não poder fazer nada, eu dei sorte: peguei um vendedor legal na Movistar, uma moça de loja zuada super simpática e um atendente da Sube superlegal. Nisso, resolvi que o dia estava para um
Frank's e chegando lá ainda tive a sorte de encontrar os bartenders que eu mais curto na cidade e ganhar uns drinks. Fim.
A semana que entrou foi meio estressante. Eu me mudei de emprego e ainda estou em fase de adaptação e tudo é sempre pra ontem, como a maioria das empresas, né. Então, além de me readaptar ao ritmo louco de trabalho eu, ainda, estou me acostumando com outras maneiras de resolver as coisas.
Daí que decidi que merecia um descanso no final de semana e compre uma aula de culinária francesa em San Telmo para distrair a cabeça.
Sábado, 27 de abril: acordei, também, cedo fui à aula em
San Telmo. O dia estava nublado, meio melancólico e San Telmo estava deslumbrante. Eu nunca tinha visto beleza no bairro mas, incrivelmente nesse dia eu vi. Fui com a câmera em mãos e muita vontade de provar o coelho do
L'Atelier de Céline e os crepes do
Un, Dos, Crepes.
A aula foi super legal, comi bem e resolvi sair para fotografar San Telmo. As suas vielas, ruas lindas. Nisso uma amiga minha me liga no cel. No movimento que eu fiz para tirar o celular da bolsa e colocar na orelha, passa um malandro de bicicleta que pega meu celular, novo, e leva embora. Eu, louca, saí correndo atrás do cara. E desculpe, mas a gente, às vezes, não pensa nas consequências que isso pode nos trazer. Gritei atrás dele, xinguei horrores. Consegui alcançá-lo e nisso ele agarrou o celular com mais força e nessa ação bruta levei uma ''celularzada'' no queixo. Daí me lembrei que estava com a minha bolsa, com a câmera e com meus documentos. E o vi partir. E desabei a chorar no meio da Avenida Belgrano. Muitas gente na rua viu, mas ninguém fez nada.
De novo, meu celular roubado. Sensação maior de impotência não há. Não há. Ok, era só um celular. Mas não é pelo aparelho porque a essa altura do campeonato eu já estou desapegada, mas é pela impotência. Pela covardia desses imbecis de tirar o que é nosso, de gente decente, pra poder fazer a vida às nossas custas.
Nisso, chorando, apareceu um menino chamado
Brian. Maior educação não há. Ele me ajudou a ligar na Movistar e a cancelar a linha com um atendente SUPER chato e mal educado que ousou em dizer ''no estás cooperando, Amanda''. OI? Eu tinha acabado de ser assaltada e ele dizia que eu não estava cooperando no cancelamento da linha? Absurdo. O Brian me ajudou em tudo e foi um amor de pessoa. Obrigada, Brian.
Com um problema para resolver, porque mesmo sem celular eu ainda tenho que pagar a conta e comprar outro aparelho. Eu fui embora pra casa com uma sensação de estar nua. E algo que nunca aconteceu comigo, nessa hora aconteceu: eu fiquei com medo de pegar ônibus e fui pra casa de táxi.
A
taxista, outro amor, escutou meu muro de lamentações e começou a chorar porque ela estava enfrentando um belo de um mistério no bairro dela: segunda cachorra morta em duas semanas por envenenamento. Ela estava de coração partido. Acho que ali uma ajudou a outra.
Cheguei em casa super chateada, fui ao kiosco e resolvi sair da dieta comprando uma cookie da Toddy. Nisso ouço o cara do lado se queixando que a mãe está na fila do corredor do hospital há dias esperando ser atendida. E daí, realmente eu me lembrei dessa cena de
Amélie Poulain:
Ainda que nossos casos sejam diferentes, tudo leva a uma mesma problemática: a perca de fé no ser humano. E isso não acontece só em Buenos, ou em São Paulo, ou sei lá, no México. É geral, gente! Geral. No final das contas tudo o que nos resta é isso: a humanidade. E sem isso, só tem matéria no mundo. Matéria que vai ficar na Terra enquanto você é enterrado e leva pra outro mundo só as coisas que você fez. Matéria que vai enchendo o mundo de sujeira e que quando você morrer não levar nada pra você.
É muito forte essa coisa de perder fé na humanidade porque o homem foi feito pra viver em contato com outras pessoas. E é incrível que ainda hoje, e com tantos problemas sérios que temos, isso se perca. As pessoas perderam a razão.
Nesse mesmo dia, no sábado, eu cheguei em casa. Tirei os sapatos, tomei um banho e me lembrei que o
Santi Macias, do delicioso restaurante
I-latina, me havia dado pães de queijo para comer em casa. Obrigada, Santi pelos pães de queijo, me ajudaram a ficar mais quentinha em casa. E a me sentir mais perto da minha família.
Enquanto eu comia os pães de queijo do I-latina, eu abri minha caixa de e-mails do blog e vi esse e-mail aqui que, com licença
Flora, vou compartilhar no blog:
''Amanda,
Me chamo Flora, sou do Rio de Janeiro e estou em Buenos pela primeira vez!
A vida tem umas coisas curiosas e numa dessas, eu que nunca quis vir à Buenos (ela estava no fim da minha listinha de viagens), resolvi aproveitar uma promoção de passagem aérea para vir com meu namorado!
Aí, muito cansados do trabalho, tudo meio em cima da hora e decidimos que viríamos sem guia turístico sem roteiro neurótico Plano: vamos, e lá a gente faz o que der na telha. Foi então que escolhi alugar um apt ao invés de hotel, para ficarmos mais a vontade e sem a piração digna de turistas! (...)
Mas foi nessa andança despretensiosa que encontrei seu blog e me apaixonei! Cheguei a virar noites na duas ultimas semanas, para ler seu blog! Queria ler todos os posts antes de vir! Não consegui, mas ainda assim, tirei dicas preciosas de lá! Posso te dizer que não montamos um roteiro neurótico turístico, mas montei um roteiro do coração Eu fiquei tão agradecida que trouxe uma lembrancinha do RJ pra você! Apenas um mimo, um jeitinho de te abraçar indiretamente!
E pra "piorar", todas as suas dicas deram super certo! Enlouqueci na rua Nicaragua, me apaixonei pelo Oui Oui, amei o café Amenabar, fomos ate o Bonjour Paris na Recoleta e foi uma delícia, fora a ida inesquecível ao La Cabrera (que fiz questão de preencher o cartão sobre sugestões e dizer que a indicação partiu do seu blog) e todo o resto: empanadas, sorvete de doce de leite, rocambole feito em casa com massa já pronta! Enfim, segui cada dica sua, até as que estavam nas entrelinhas e tive dias maravilhosos e inesquecíveis aqui! Foi tanta felicidade, que pela primeira vez na vida, torci pra chover, porque sabia que nem isso estragaria, pelo contrario, só tornaria mais charmoso! E hoje chove em Buenos!
Enfim, falo demais! Na verdade, escrevi pra agradecer e pra dizer que quero muito te entregar a lembrança q trouxe!
Não sei se você lerá isto a tempo e se dará para ser pessoalmente (hoje vamos jantar em Puerto Madero) e amanhã desayuno de despedida no Oui Oui (caso de amor grave!). Se você ler isto e quiser/ puder aparecer, ótimo! Senão, pensei em um plano (meio Amelie Poulain) de deixar a lembrança no Oui Oui com a garçonete e você busca outro dia, quando puder. Que tal?
Sinta-se abraçada e agradecida de verdade por mim!
Um beijo, Flora.''
E eu não preciso nem COMENTAR nada sobre isso. A minha emoção, ok que estava sensível, foi tanta que na hora respondi pra Flora que ela, realmente, foi a minha Amélie do dia. O desayuno com ela e com o marido foi como Amélie adoraria que fosse: bem francês, bem boêmio, bem simples e de coração.
Enfim, esse texto todo pra dizer que essa semana eu quero tentar reencontrar a Buenos linda que está dormindo dentro de mim. Logo, eu sugiro algo: me ajudem! Cada comentário me lembrando que Buenos é linda só vai me fazer voltar a ser uma espécie de Amélie porteña-brasileira que eu sempre fui e quero continuar sendo.
Que o mundo tenha mais tios de kioscos legais, atendentes da Movistar atenciosos, Brians que caiam do céu, Santis com pães de queijo e Floras pra alegrar nosso dia.
Obrigada, gente.